Jamill Barbosa Ferreira - @JAMILLISSIMO -
Quando o luxo é oferecido na passarela, às vezes, a produção usa de
humor para cativar as clientes. Porém, a oferta não sai do controle e
nem a cliente deveria sair. É como uma dança de neurônios, prazeres,
castigos e privilégios. É comum que, atualmente, alguns jornalistas de
moda defendam que o mercado de luxo tem o único objetivo de representar e
vender a idéia da marca, para que o consumidor-alvo possa, de forma
deslumbrada, sair do controle e, sem pensar em poder aquisitivo, comprar
qualquer coisa que o insira na mesma ‘idéia’, no mesmo grupo. Então,
perfumes, acessórios mais baratos e qualquer coisa que você possa
imaginar vinda do mundo das falsificações, são muito vendidos. Essa é
uma das estratégias de marketing e não há duvida de que se há uma
maneira de lucrar a mais, será usada e incentivada.
Mas, que tal pensar em quem realmente compra e usa a proposta do
topo? O alvo do legítimo mercado de luxo é a clientela ‘top’ e ninguém
ali quer fazer show para quem não pode comprar. É uma questão de
vaidade, acima da necessidade do lucro fácil que virá da turma
deslumbrada. Talvez, um ou outro vestido possa ser de uma expressão
artística tão forte que somente o sussurro da vendedora exclusiva, ao
ouvido da cliente, a fará perceber que a intenção do costureiro é, além
de vesti-las, mostrar que o “chique” pode ser inesperado.
Há cada vez mais pessoas interessadas por assuntos envolvendo moda e a
maioria delas vem do grupo dos deslumbrados. Mas, não devemos
culpá-las, sonhar é para todos. A moda, em si, funciona dessa maneira e
tortura os pobres que são envolvidos pelo charme da roupa e da marca. As
faculdades estão entupidas de gente que quer ser profissional da área,
mas, que viverá apenas as ilusões e vontades enquanto o tempo passará,
puxando, aos poucos, o tapete sobre os pés que jamais usaram todos os
sapatos que gostaria. Quando o puxão final acontece, a queda na
realidade é tão bruta que a única coisa que resta é perceber que o tempo
passou, nada foi feito e esse foi apenas um dos castigos proporcionados
pela moda. O mesmo acontece para quem aspira ser uma pessoa colunável,
quando a verdade carimba de forma desinteressante o sobrenome, a
história pessoal, econômica e profissional. Interessante quando a
verdade entra em jogo…
Você quer falar mesmo de realidade? Ontem, dia 31 de outubro, caiu a
nave da Virgin Galactic, e as pessoas lamentaram muito mais pelo 35º
teste de voo que deu errado, do que pela perda de dois pilotos. O fato é
que estamos cada vez mais sedentos por novidades que impulsionem nossas
fantasias e ilusões, enquanto a única verdade nesse acontecimento foi a
perda dos dois pilotos… Os testes continuarão, é obvio. Dia 20 de
outubro também houve uma perda na criação de moda, Oscar de la Renta
morreu de câncer e as pessoas lamentam, esquecendo que a lamentação não é
um bom sentimento para alguém que aproveitou a moda e seus recursos
criativos de modo que fez exatamente tudo que quis; ele apenas partiu
depois de tanto fazer e ser. Teriam feito as mesmas lamentações se ele
não fosse famoso e estivesse apenas contribuindo para algo que viria a
ser um combustível de novos desejos e expectativas? É preciso saber que o
que nos torna especiais são as experiências que temos dentro da área
que escolhemos, sem que caiamos na mesmice barata dos derrotados, que
buscam culpar os outros pelo seu castigo; ou, na tentativa de expressar
interesse num estudo ou num grupo, focam somente no terreno, quando, na
verdade, há vidas de pessoas desconhecidas que foram perdidas pelo
caminho. ‘Extra! Extra! E lá vem o John Galliano, em janeiro, assinando
Maison Martin Margiela’. A humanidade precisa de sonhos de consumo, de
luxos, mesmo que não possa pagar por eles.
Então, em meio a uma moda popular cada vez mais repleta de realismo
com roupas em tecidos iguais, que imitam personagens de novelas e lotam
casas de shows populares, apropriadas para trabalho, rotina e escola, o
luxo jamais deixa de fazer sonhar acima desse nevoeiro desinteressante
do tecido usado para cobrir a nudez.
É inaceitável esse negócio de que a alta costura é desenvolvida a
partir da moda de rua. As clientes não são interessadas nisso, mesmo que
o costureiro queira e faça uma coleção que tem inspiração na moda de
rua, pode conseguir que a imprensa publique e agrade o povão, mas, o
povão não compra alta costura, nem jóias legítimas. O povo, na maioria,
evita entender o valor da qualidade, da técnica e do material de um
produto de alto luxo – a palavra “luxo”, talvez pela banalização, exija
um complemento, um belo “alta”, para manter-se disponível ao aprendizado
–, além da exclusividade da participação desse mercado, limitando-se,
no máximo, a compra de um perfume, um artigo do segmento popular, esse
tipo ouro simples, 750, de shopping center e, até aí está certo, pois, é
um segmento comercial disponível e acessível; o problema está em quem
fica numa certa ilusão de que isso é “chique” e, pior, “essencial”.
Mas, obviamente, luxo está bem além da moda de rua, de acessibilidade
econômica, e eu estou aqui para mostrar que bem além da classificação
de futilidade, geralmente dada por países de Terceiro Mundo, o luxo
legítimo é uma requintada moldura das sociedades mais civilizadas do
mundo; então, se um costureiro “desprezasse” as clientes dessa forma,
para tentar dizer e mostrar que a alta moda é um reflexo da moda de rua,
ele perderia o emprego na mesma hora… Enquanto a Kim Kardashian compra
uma arma que pertenceu a Yves Saint Laurent, ou o Valentino lança seu
livro sobre decoração de mesas com porcelanas de luxo.
Compreender o mercado de luxo, mesmo para quem não participa nem
consome, é uma atitude de ampliação de percepção humana. Com a
modernidade e pesquisas em busca de seres extraterrestres, quase não há
nada mais naturalmente diferente do que, ao embalo de uma música techno,
iluminação apropriada e metais, pedras e tecidos preciosos, vermos uma
manequim desfilar em Paris, caminhando sobre um salto que lhe atribui
altura e postura fora do comum, mostrando-nos que, talvez, a cultura
alienígena, do diferencial físico e capacidade tecnológica, esteja
somente no que podemos ser através da moda, enquanto os aparelhos mais
modernos “teletransportam” informações, fotos e vídeos uns para os
outros ou para a internet.
Somos mais modernos do que podemos imaginar e enquanto essa
capacidade nos possibilita compreensão, podemos aceitar e respeitar o
luxo como uma expressão máxima que nos diferencia, valorizando e
incentivando não somente às exclusivas clientes que têm o privilégio,
mas, também, a você, que pode afirmar ter possibilidade e conhecimento
de que compreender, respeitar e admirar é também uma capacidade humana
que possibilita ao seu conhecimento o rótulo de luxo.
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